quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Cientista quer transformar galinha em dinossauro

O paleontólogo Jack Horner quer recriar um dinossauro a partir do DNA da galinha. A intenção é fazer a evolução reversa, ou seja, fazer ressurgir traços genéticos dos ancestrais nos animais modernos.
Nas últimas décadas, paleontologistas – incluindo Horner – têm encontrado uma ampla evidência para provar que os pássaros modernos são descendentes de dinossauros – há semelhança desde o jeito com que colocam os ovos nos ninhos até detalhes da anatomia dos ossos. Há similaridades entre os pássaros atuais e os ancestrais carnívoros de duas patas, como Tiranossauro Rex e Velociraptor.
Editora Globo
O que Horner quer é trazer à tona essas semelhanças em um processo chamado atavismo, ou seja, a reaparição de características vindas de um antepassado que não havia se manifestado nas gerações intermediárias. Um exemplo disso seria um bebê humano que nasce com mamilo extra ou, muito raramente, com uma cauda.

Como é um fenômeno raro, a proposta de Horner é criar atavismos experimentais em laboratório. Desse modo, ele ativaria o máximo possível de características ancestrais de uma galinha até chegar próximo de um dinossauro.
Essa ideia foi exposta pelo cientista recentemente na TED Conference, encontro anual de tecnologia, entretenimento e design que acontece na Califórnia (EUA).

“É uma loucura”, declarou Horner na ocasião. “Mas ainda assim é possível”, disse.
Em entrevista à revista Wired, o paleontólogo e cientista deu detalhes de sua tese.
Segundo Horner, pesquisas já descobriram pistas instigantes que apontam que algumas características de dinossauros podem ser reativadas.

Não se trata de reproduzir a ideia do filme Jurassic Park, de Steven Spielberg. No filme, o cientista Michael Crichton usa DNA de dinossauros, preservados no fóssil de insetos sugadores de sangue, para reproduzir o animal pré-histórico.

Horner, inclusive, foi um dos consultores do filme e, após analisar essa ideia, descartou a possibilidade de clonagem.

Ele concluiu que o DNA se rompe muito rápido, mesmo que o fóssil esteja bem conservado. Então Horner foi buscar na biologia que estuda a evolução uma forma de recriar dinossauros.

Para desenvolver a tese de que é possível criar dinossauros a partir da galinha, Horner tomou como base um livro de biologia da década de 80 chamada “Endless Forms Most Beautiful”, do biólogo Sean Carrol.

O livro ajudou a lançar as bases para o campo da biologia evolutiva, que se concentra em descobrir os mecanismos moleculares da evolução. É fato que os seres vivos mudam ao longo das gerações, segundo a aleatória mutação genética e os efeitos do meio ambiente. Porém, os biólogos queriam determinar, exatamente, o que ocasiona essas mudanças.
Usando moscas de frutas, o estudo separou um grupo de genes que controla a forma como se estrutura o corpo da mosca, chamado Hox. Surpreendemente, estes genes são encontrado em tudo, desde vermes até humanos.

Esses genes são a chave que regula o desenvolvimento. Ou seja, eles controlam o momento em que uma parte do corpo vai se estruturar. Por exemplo, determinam a arquitetura de seis patas de um inseto ou as barbatanas de um peixe.

Com isso, foi possível concluir que formas diferentes do corpo não são resultados de genes diferentes, mas de usos diferentes durante o desenvolvimento.

Assim, fazer um ovo de galinha chocar um dinossauro bebê pode ser apenas uma questão de apagar o que a evolução tem feito para a tornar uma galinha.
Cada célula de uma galinha carrega o código para fazer um tiranossauro, mas a forma como os genes fizeram a leitura ao longo do tempo mudou. O que Horner quer fazer é controlar esses genes e, assim, conseguir transformar a galinha em um dinossauro.

Por enquanto, é só uma teoria. Mas já tem balançado biólogos e a comunidade acadêmica.

Para seguir com sua ideia, Horner esta à procura de um cientista de pós-doutorado na área de Biologia para se juntar ao seu grupo. Segundo o cientista, ele já tem algumas possíveis fontes de financiamento para seu projeto. 
Partes da Galinha que podem ser modificadas

- Dentes: o código básico para o desenvolvimento dos dentes ainda está presente nas células das galinhas, mas está em estado de dormência nos últimos 60 milhões de anos.

- Bicos: As aves têm um perfil inconfundível: os bicos. Pesquisadores de Harvard recentemente mexeram em alguns genes e conseguiram transformar um bico de galinha parecido ao focinho de um jacaré.

- Penas e pele: A textura áspera escamosa de pés de frango se aproxima da escamosa cobertura de terópodes – sem necessidade de modificação. O pássaro poderia parecer ainda mais com dinossauros por meio de cruzamento com espécies sem penas.

- Cauda – Dinossauros de duas patas contam com longas caudas rígidas para o equilíbrio. Galinhas vivem com uma curta. Pelo menos dois grupos de genes está envolvido na formação da cauda. Se os cientistas aprenderem a desligar os genes certos, eles podem ser capazes de dar uma longa cauda ao futuro "galinhossauro".

- Patas - A maioria dos terópodes tinham três dedos, mãos com garras afiadas para escalar, agarrar e cortar. Aves ainda têm os ossos dos dedos, mas eles são fundidos na asa. Controlando o processo de fusão no interior do ovo, os cientistas poderiam induzir uma galinha a nascer com as garras.

- Fêmur: em muitos animais o fêmur – maior osso do corpo – é quase horizontal. Alguns galos de briga da Ásia andam de cabeça erguida, como seus ancestrais. Os criadores de dinossauros podem começar com essa espécie para criar um galinhossauro, cujo modo de andar suportar o peso desta estatura.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

De servo a senhorMolécula de RNA assume o lugar do DNA como promessa para combater doenças

Cada uma de nossas células guarda a receita para o seu funcionamento na molécula de DNA, a dupla fita de ácido desoxirribonucléico em forma de escada em espiral. Para funcionar, porém, as células dependem da ação de uma família de moléculas mais simples e versáteis, em geral formadas por uma fita única de ácido ribonucléico: o RNA. A todo momento um tipo específico de RNA chamado mensageiro copia as instruções contidas nos genes e as envia ao local em que serão lidas para originar proteínas, os componentes fundamentais dos seres vivos. É uma tarefa mais complicada do que parece, pois o caminho percorrido pelo mensageiro é repleto de obstáculos e armadilhas. Como o capitão Gulliver, subjugado pelos minúsculos habitantes de Liliput no romance de Jonathan Swift, os mensageiros são freqüentemente interceptados e amordaçados, por vezes até desmembrados, por outra variedade de moléculas de RNA ainda menores: os micro-RNAs, que agem associados a um complexo de proteínas. A receita para produzir micro-RNAs está em trechos do DNA que até recentemente se pensava não terem função – por isso conhecidos como DNA-lixo. “Um lixo que é luxo”, afirma o biólogo molecular Carlos Menck, da Universidade de São Paulo (USP), que estima que entre 30% e 40% do genoma humano se dedique exclusivamente a produzir RNA com a função essencial de regular quase tudo o que acontece nas células. Em experimentos com o verme Caenorhabditis elegans, usado como modelo biológico de seres vivos mais complexos, os pesquisadores norte-americanos Andrew Fire e Craig Mello demonstraram em 1998 que pequenas moléculas de RNA injetadas bloqueavam com eficiência a interpretação de certos comandos celulares – processo que batizaram de interferência por RNA. Dito de maneira simples, o RNA silenciava os genes, impedindo a produção de proteínas.
O trabalho de Fire e Mello valeu à dupla o Nobel de Medicina de 2006 e revelou a geneticistas e biólogos moleculares uma nova estratégia de assumir o comando celular e assim tentar combater de modo eficaz e definitivo problemas de origem genética como o câncer. Usando micro-RNAs como molde, pesquisadores da Europa e dos Estados Unidos recentemente passaram a produzir em laboratório moléculas de RNA desenhadas especificamente para interferir no funcionamento de certos genes. Essas moléculas criadas artificialmente são os chamados RNAs de interferência, ou simplesmente RNAi, que à semelhança do DNA são formados por uma fita dupla em vez de simples. Assim como os micro-RNAs, os RNAi interceptam e destroem as informações celulares antes que sejam processadas e originem proteínas. Com o auxílio dessa ferramenta, equipes da USP e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) começam a compreender melhor como surgem determinadas formas de epilepsia, câncer e enfermidades cardiovasculares. Também dão os primeiros passos para verificar o potencial dessas moléculas para controlar esses problemas de saúde, além de outros provocados por vírus, bactérias, protozoários e vermes.
“O RNAi tem um grande potencial terapêutico”, afirma a geneticista Iscia Lopes-Cendes, da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Testes concluídos recentemente em seu laboratório indicam que o RNAi pode ajudar a combater a infestação pelo verme Schistosoma mansoni, causador da esquistossomose, problema que atinge cerca de 200 milhões de pessoas no mundo. A equipe de Iscia preparou cópias de RNA para inativar um gene essencial para o metabolismo do S. mansoni e aplicou em camundongos infestados com o verme. Em seis dias, o número de parasitas nos camundongos era 27% menor, uma redução que os pesquisadores consideraram promissora como ponto de partida. Apesar do resultado esperançoso, a geneticista mostra-se cautelosa. “Ainda é preciso comprovar que os vermes realmente morreram como conseqüência direta da inibição por RNAi”, explica. Por essa razão, ela investiga agora o efeito do RNAi aplicado diretamente sobre os parasitas isolados, mantidos em placas de vidro. Além de eficaz, essa técnica promete menos efeitos indesejados nos casos em que se pretende combater microorganismos invasores como vírus, bactérias, protozoários ou vermes porque é possível desenhar uma molécula de RNA exclusiva para genes do parasita, sem correspondente nos seres humanos.
Antes dos experimentos, porém, foi preciso aprender a fabricar as cópias de RNAi. Durante o doutorado concluído em 2005 no grupo de Iscia, o bioquímico Tiago Pereira desenvolveu um programa de computador capaz de desenhar moléculas de RNAi sob medida. Foi um avanço e tanto não apenas para o grupo da Unicamp. Disponível gratuitamente no site do laboratório na internet, o programa criado por Pereira permite agora que os pesquisadores brasileiros interessados em usar o RNAi não dependam mais exclusivamente de empresas estrangeiras. Quem pretende silenciar um gene específico pode usar o programa da Unicamp para projetar o RNAi desejado e enviar a seqüência específica dessa molécula para empresas internacionais especializadas em produzi-la em grande quantidade.
Controlar doenças - Alguns dos RNAs desenhados pela equipe de Iscia já chegaram ao laboratório do cardiologista Kleber Franchini, em outro prédio da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Intrigado com o aumento do coração causado por hipertensão arterial, Franchini encomendou moléculas de RNA para interferir em processos celulares que levam ao crescimento e deterioração do coração em pacientes com hipertensão arterial, além de outras doenças cardíacas. Logo no primeiro dia após injetar RNAi nos camundongos com hipertensão, ele observou uma queda de 70% nos níveis de algumas proteínas que regulam a divisão celular, o que impediu os problemas funcionais que decorrem do aumento do coração. Melhor: esse efeito durou 15 dias, sugerindo que o RNAi pode, no futuro, se tornar uma forma de impedir o crescimento exagerado do músculo cardíaco, que em casos extremos prejudica o bombeamento de sangue para o organismo e pode levar à morte.
Em São Paulo, no Instituto do Coração (InCor), a bióloga Luciana Vasques usa essa técnica com o objetivo de resolver um problema decorrente de uma cirurgia que é parte da rotina dos cardiologistas: a ponte de safena, substituição de artérias obstruídas do coração por trechos da veia safena, retirada da coxa. Transplantada para o coração, a veia pode reagir ao novo ambiente promovendo a multiplicação de células musculares em suas paredes, que se tornam mais espessas, podendo prejudicar a passagem do sangue. Para inibir esse espessamento, Luciana testou moléculas de RNAi capazes de desativar um gene envolvido na proliferação celular em vasos sangüíneos. O tratamento reduziu em 70% a multiplicação de células de ratos in vitro. Agora Luciana tenta descobrir os efeitos dessa terapia nos ratos vivos.
Do problema à solução - Ao impedir o funcionamento dos genes, o RNAi faz mais do que tratar um problema. Também pode revelar sua origem. Na Unicamp, Iscia vem utilizando o RNAi para entender como surge a epilepsia. Ela silenciou genes ativados em estágios distintos do desenvolvimento cerebral de camundongos e constatou que formas diferentes de epilepsia originam-se em estágios específicos da vida. Wilson Araújo da Silva, biólogo da USP em Ribeirão Preto, tenta identificar como o mecanismo de regulação por RNA aciona ou desliga genes em momentos inadequados e, assim, levam ao surgimento de diferentes tipos de câncer. Atualmente no Ludwig Institute at Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, em Nova York, Silva projeta moléculas de RNAi para silenciar genes associados a tumores como de mama, pulmão e pele. “Provavelmente o silenciamento de genes não substituirá os procedimentos cirúrgicos, mas permitirá retardar o desenvolvimento de certos tipos de câncer”, comenta Silva.
Embora sejam necessários anos de pesquisa antes que o silenciamento esteja disponível para as pessoas, os resultados obtidos já permitem classificar o RNAi como a grande promessa da genética para curar doenças. É uma posição que já foi ocupada anos atrás pela terapia gênica, que tentava substituir genes defeituosos por outros saudáveis, mas ainda não funcionou como se esperava. Biólogos e geneticistas apostam no RNAi por duas razões: é uma técnica mais barata que a terapia gênica e, nos experimentos já realizados, chega a silenciar 90% dos genes escolhidos como alvo. Se de fato der certo, o silenciamento de genes pode significar uma injeção de prestígio no Projeto Genoma Humano. Considerado um dos grandes investimentos da ciência no final do século passado, o seqüenciamento dos genes humanos gerou certa decepção por não produzir um impacto imediato na área médica. Hoje é possível vasculhar o genoma de uma pessoa e identificar genes que indicam propensão a doenças. Mas, exceto em raros casos, essa informação não ajuda no tratamento ou na prevenção do problema.
O otimismo que rodeia o potencial terapêutico do RNAi pode ser medido pelo investimento da indústria, que financia entre 30% e 40% do trabalho de Franchini na Unicamp. Mais de 30 empresas farmacêuticas e de biotecnologia já buscam usar essas moléculas em medicina. Um exemplo é a Sirna Therapeutics, criada para desenvolver tratamentos à base de RNAi e em dezembro de 2006 comprada pela Merck, uma das gigantes mundiais da indústria farmacêutica. Nas palavras do presidente da Sirna, a empresa pretende estar “prestes a mudar a medicina moderna, potencialmente parar doenças antes que possam progredir e, em alguns casos, reverter o próprio processo da doença”. A Sirna pretende tratar assim qualquer doença humana – talvez um exagero de otimismo, mas para algumas doenças o RNAi tem se mostrado de fato eficaz em testes clínicos.
Nós a desatar - Antes que essa promessa se concretize, porém, restam vários nós a desatar. O mais importante é determinar se o RNAi é realmente seguro para seres humanos. Assim como pode interromper o funcionamento de genes associados a doenças, o silenciamento também é capaz de afetar outros responsáveis por funções importantes das células, como controlar a sua proliferação – desarranjo que pode dar origem a câncer. Outra dificuldade é fazer as moléculas de RNAi atingirem o alvo correto, uma vez que injetadas na corrente sangüínea elas geralmente se dispersam pelo organismo antes de se concentrarem nos rins, de onde são excretadas sem terem atingido o objetivo. Tenta-se contornar esse problema indicando o uso do RNA terapêutico para enfermidades que podem ser tratadas por meio de aplicações localizadas, como injeções feitas diretamente no olho para combater a degeneração macular da retina, o uso de sprays contra a asma ou aplicações de cremes vaginais contra infecções.
No mundo todo ainda se buscam formas de aumentar a estabilidade e a durabilidade do RNAi no organismo. Muitas vezes os efeitos que produz ainda são efêmeros – essas moléculas não se multiplicam dentro das células e podem ser degradadas por enzimas específicas para RNA. Uma estratégia adotada por alguns pesquisadores como Luciana, do InCor, é inseri-las no material genético de um vírus inócuo para seres humanos. Esses vírus invadem as células que atingem e inserem seu material genético no genoma do hospedeiro. Essas células passam então a fazer cópias do RNA terapêutico junto com as cópias de seus próprios genes, com um possível efeito permanente. Outros, como Iscia, da Unicamp, preferem fazer aplicações localizadas de moléculas “nuas” de RNAi, com pequenas alterações que aumentem a sua estabilidade.
“Uma de nossas preocupações é saber o que acontece no organismo no médio e no longo prazo”, diz Iscia. Apesar desses nós, comuns a qualquer área da ciência em fase inicial de desenvolvimento, os geneticistas se mostram otimistas e acreditam que em breve se conhecerá o suficiente sobre o funcionamento do RNAi para superar essas dificuldades. “A ciência do RNAi está apenas começando; por isso os projetos de pesquisa na área devem ser induzidos”, afirma Carlos Menck, que coordena um dos quatro laboratórios que integram o Centro de Terapia Gênica e Vacinas da USP, fundado há cerca de três anos. Enquanto isso não ocorre, ele age por conta própria e tenta arrebanhar seus colegas, que ainda trabalham sobre o mesmo tema, mas de forma isolada. “O silenciamento de genes com o RNAi pode dar unidade real ao centro, pois se presta às indagações de todos os seus pesquisadores”, diz. Atitudes como essa talvez consigam fazer Gulliver se erguer e assumir o controle sobre os liliputianos.

FEIJÃO TRANSGÊNICO BY BRASIL

A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) aprovou na quinta-feira (15/09) a produção de um feijão geneticamente modificado desenvolvido pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). A alteração impede que a planta contraia a doença conhecida como mosaico dourado, capaz de dizimar plantações inteiras. “O que está em jogo não é só o feijão”, afirma o engenheiro agrônomo Francisco Aragão, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen), um dos responsáveis pelo desenvolvimento do novo transgênico junto com Josias Faria, da Embrapa Arroz e Feijão. “O que está em jogo é também o fato de que demonstramos que é possível gerar e produzir essa tecnologia no Brasil, e numa instituição pública.”
O mosaico dourado causa danos em todos os lugares em que se cultiva feijão nas Américas. No Brasil, só não é um problema no Rio Grande do Sul, onde a mosca-branca transmissora não se adapta bem ao frio. Segundo estimativas da Embrapa Arroz e Feijão, entre 9 e 18 milhões de pessoas encheriam os pratos de feijão com as safras perdidas para a doença.
Para combater o vírus, os pesquisadores da Embrapa fizeram uso dos próprios mecanismos de defesa do feijão. Aragão explica que as plantas, em vez de anticorpos, combatem as doenças com pequenos fragmentos de RNA, o RNA de interferência (RNAi). É um sistema imunológico inato, embutido no material genético do organismo. No caso específico do feijão e desse tipo de vírus, o RNAi evita que seja produzida uma proteína (REP) essencial para a replicação dos invasores. Mas essa defesa não é ativada de imediato, e por isso com frequência não basta para conter a multiplicação do vírus. “É como uma barragem com um furinho que vai se alargando à medida que a água passa”, compara. “O que nós fizemos foi tapar o furo.”
Eles “taparam” o furo antecipando a produção dessas moléculas de RNAi. Isso foi possível pela inserção no DNA da planta do trecho do material genético viral para a produção dos pequenos RNAs que regulam a produção da proteína REP. Essas moléculas também são produzidas no feijão comum, mas na planta transgênica um promotor (algo como um interruptor que, quando ligado, ativa o gene a que está atrelado) constitutivo faz com que esse RNA seja produzido o tempo todo. Assim, o vírus é combatido de imediato a qualquer momento que entre nas células das folhas, das vagens ou do caule do feijão.
Mas, para que uma planta transgênica seja aprovada, não basta fazer a engenharia genética. Aragão e seus colegas vêm estudando a planta desde 2005, e viram que nada é alterado. “Fizemos a caracterização molecular, agronômica e nutricional em termos de vitaminas, aminoácidos e açúcares”, conta o pesquisador. Eles também alimentaram animais com o feijão modificado, e não detectaram alteração alguma.
Além de reduzir a mortalidade nas lavouras de feijão, o aumento na capacidade de a planta combater a doença por conta própria reduziria em muito o uso de inseticidas nas plantações, usados para combater as moscas-brancas. A produção se tornaria assim menos nociva à saúde e também mais barata.
A aprovação na CTNBio se deu por votação depois de análise técnica de um relatório de 500 páginas elaborado pelos pesquisadores da Embrapa. Mas ela não é o fim do caminho. “Vamos agora fazer os ensaios para registrar as principais variedades de feijão, que devem demorar um ano e meio”, conta Aragão. Os estudos até agora foram feitos com o feijão-carioquinha, o mais plantado no país. Em seguida, será a vez do feijão-preto e do roxinho. “Em 3 anos devemos ter as sementes para os produtores”, prevê. Outra vantagem desse feijão modificado é a estabilidade: a partir da leva inicial, os produtores serão capazes de produzir por conta própria as sementes com as mesmas características.
Isso, claro, se a aprovação se mantiver. “Os ativistas contra transgênicos são mais enfáticos contra esse transgênico, produzido no Brasil, do que contra os feitos pelas grandes empresas internacionais”, lamenta Aragão. Para Walter Colli, professor do Instituto de Química da Universidade de São Paulo e presidente da CTNBio entre 2006 e 2009, “a justiça cometerá uma injustiça se barrar o feijão da Embrapa”. Ele explica que a comissão é constituída por lei e composta por cientistas que entendem dos processos íntimos da genética e advogados, habilitados para avaliar os possíveis riscos das modificações feitas nas plantas.
“A tecnologia empregada por Aragão é limpa, linda e original”, sentencia Colli. Caso entre de fato em produção, o feijão da Embrapa será a primeira variedade modificada produzida no Brasil, sem participação das grandes empresas multinacionais.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Novidade sobre a Evolução das Aves

A revista especializada Science divulgou nesta quinta-feira imagens de estruturas primitivas que podem representar os mais antigos "experimentos" evolucionários que levaram ao aparecimento das penas - chamados pela publicação de "dinoplumas" (os primeiros animais a terem penas eram dinossauros). Segundo os pesquisadores, as penas foram tão bem preservadas que é possível observar "sugestões" das cores que elas tinham.
Segundo o site da publicação, as penas primitivas (chamadas pelos cientistas de protopenas) foram encontradas presas em âmbar - que preservou as estruturas. O paleontólogo Ryan McKellar, da Universidade de Alberta (Canadá) as encontrou ao explorar os depósitos dos museus canadenses.
McKellar estudou mais de 4 mil peças de âmbar, descobriu 11 que continham as estruturas e encontrou, em algumas, muitas similaridades com as penas modernas - como pequenos filamentos parecidos com os encontrados nas aves contemporâneas.
Primeiras penas era encontradas em dinossauros. Foto: Science/AP
Por outro lado, outras estruturas não lembram em nada as criaturas que vivem hoje. O paleontólogo afirma que algumas têm filamentos minúsculos, com cerca de 16 micrômetros (o tamanho dos mais finos fios de cabelo humano) regularmente espaçados. Eles não têm paredes celulares - o que indica que não são plantas nem fungos. Em nível microscópico, também são diferentes dos pelos de mamíferos. "Nós não temos certeza do que (essas estruturas) são, mas temos bastante certeza do que elas não são", diz o pesquisador. McKellar diz que podem ser protopenas, já que lembram estruturas carbonizadas encontradas em alguns fósseis chineses preservados em sedimentos.
O ornitólogo Richard Prum, da Universidade de Yale - não envolvido diretamente com a pesquisa -, afirma à Science que McKellar e seus colegas apresentaram "uma excitante e ampla amostra de penas". Contudo, ele diz que é difícil afirmar que algumas das estruturas são protopenas, já que faltam alguns detalhes característicos - como um pequeno pedaço de osso ou uma amostra de pele, o que deixa a possibilidade de que elas não sejam relacionadas aos dinossauros. As amostras, inclusive, podem estar relacionadas a algo totalmente desconhecido que não havia sido preservado em fósseis anteriormente.
Dinossauros com penas
O dinossauro mais antigo com penas conhecido é o Anchiornis huxleyi, que viveu entre 151 milhões e 161 milhões de anos atrás no que hoje é o nordeste da China. Acredita-se que ave mais antiga foi o Archaeopteryx, que viveu onde hoje é a Alemanha há cerca de 150 milhões de anos

sábado, 3 de setembro de 2011

Dieta determina bactérias intestinais

© Eduardo Cesar
Carne e gordura: Bacteroides
Agora é possível, a partir de uma amostra de fezes, determinar certas características da dieta de uma pessoa. Se carne e gorduras forem o alimento dominante, as bactérias mais frequentes serão do gênero Bacteroides. Já quem prefere comer carboidratos e açúcares simples tem o intestino repleto de Prevotella. “Essas bactérias podem ou não estar associadas à causa de doenças”, pondera Christian Hoffmann, biólogo brasileiro da Universidade Federal de Goiás. Ele participou do estudo que determina o perfil bacteriano – ou enterotipo – ligado à dieta, liderado por Gary Wu, da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, onde o brasileiro faz parte de sua pesquisa de doutorado. O artigo foi publicado hoje (1º/09) na edição on-line da Science (Sciencexpress).
Quem já levou bronca do médico sabe muito bem que uma dieta rica em gorduras aumenta o risco de doença cardíaca; a novidade agora está em incluir na equação as bactérias (microbiota) que vivem no intestino e são essenciais na digestão humana, no desenvolvimento do sistema imune, entre outras contribuições. É possível que problemas de saúde criem um ambiente alterado no sistema digestivo que acabe propiciando a proliferação de um tipo de bactéria em detrimento de outro. Mas Hoffmann alerta: não se pode descartar que a própria microbiota dê origem a processos inflamatórios e seja nociva à saúde. Há, por exemplo, uma associação entre certas bactérias e a doença de Crohn, uma inflamação intestinal crônica. Resta descobrir qual é causa e qual é consequência.
A grande surpresa do estudo da Science foi verificar que parte da microbiota varia de imediato conforme a alimentação, mas as bactérias dominantes são mais estáveis: o enterotipo se mantém mesmo com alteração na dieta, pelo menos ao longo de um experimento de dez dias. Por isso, caso venha a ser comprovada uma relação causal entre bactérias e problemas de saúde, não basta fazer uma semana de dieta. “Além de poder indicar uma mudança de longo prazo na alimentação, seria ótimo poder dar um iogurte bem específico para alterar a microbiota”, imagina o pesquisador.
A descoberta ainda é inicial e, mais do que trazer respostas, reforça uma maneira integrada de pensar na saúde, levando em conta uma comunidade de organismos. Afinal, no corpo de qualquer pessoa há dez vezes mais bactérias do que células humanas. “A gente não é simplesmente humano, somos metaorganismos”, resume Hoffmann